Siderurgia: Tarifas: A Chave para a Renascença da Siderurgia Americana?

A Siderurgia Americana:

Há cerca de um ano os Estados Unidos impuseram tarifas à importação de aço sob o pretexto de se tratar de um material estratégico para o país. Não deixa de ser verdade, uma vez que a siderurgia americana não tem mais condições de fabricar alguns produtos siderúrgicos mais sofisticados como, por exemplo, os modernos aços API para tubos de grande diâmetro usados na condução de hidrocarbonetos com alto teor de ácido sulfídrico. Apesar de ser aplicável a qualquer país, essas salvaguardas se enquadram dentro da guerra comercial dos Estados Unidos com a China, país cujo protagonismo internacional vem aumentando par a par com seu desenvolvimento econômico e, portanto, está ameaçando se tornar um rival geopolítico formidável num futuro próximo.

É bem verdade que não há inocentes nessa história. Recentemente a China investiu muito em modernas usinas siderúrgicas e há quem tema que ela terá competitividade insuperável nesse setor assim que absorver e aplicar adequadamente a tecnologia embarcada nessas plantas. Mas o fato é que o preço muito baixo de seu aço também se deve a subsídios e apoios governamentais.

É difícil algum país questionar essa situação nos fóruns internacionais, dado que isso levaria a retaliações nas importações que a China faz dele – e ela se tornou um formidável parceiro comercial. Mas Trump precisa agradar seu eleitorado, a classe média atemorizada pela perda de poder aquisitivo decorrente da globalização e, em especial, a população do Rust Belt, ou seja, das regiões onde se concentram os trabalhadores em setores industriais decadentes da América. E está dando certo: várias usinas paradas há vários anos retomaram suas operações e o próprio presidente da Nucor, uma das principais siderúrgicas americanas, declarou recentemente que “Nunca houve melhor época para fabricar aço nos Estados Unidos”.

Essa atitude protecionista por parte dos antigos campeões do liberalismo econômico é muito curiosa, pois há décadas a siderurgia americana não se moderniza como deve. Foi exatamente por esse motivo que, no passado, os processadores locais de aço passaram a preferir o aço importado, mais barato e com melhor qualidade. A repentina inviabilização das importações provocou protestos desse setor, que agora vê sua competitividade ameaçada: um estudo feito no final do ano passado indicou que os clientes americanos estavam pagando 17,2% a mais pelo aço do que seus competidores estrangeiros.

Mas isso começa a ser resolvido através de soluções criativas: ao invés de se importar aço, o setor passou a importar conjuntos e peças de aço já prontos, logicamente a preços mais favoráveis do que a alternativa doméstica. Preservou-se assim a competitividade das empresas, mas não os empregos especializados do setor. O setor manufatureiro alega que emprega 46 vezes mais do que o siderúrgico e acena com a possibilidade de extinção de 460.000 empregos por conta do aço mais caro. Resta saber os efeitos disso na próxima eleição.

A questão agora é ver se as siderúrgicas americanas ficarão deitadas eternamente em berço esplêndido, acomodadas na proteção concedida por Trump, ou se aproveitarão a vantagem para se tornarem competitivas mesmo sem salvaguardas, garantindo sua sustentabilidade a longo prazo. Várias siderúrgicas já estão anunciando novos projetos e modernizações, o que parece indicar uma reação do setor. Uma delas é a Nucor, empresa que, por sinal, revolucionou a siderurgia em 1989, quando implantou industrialmente, numa de suas plantas americanas, o então inédito conceito de lingotamento de placas finas acoplado diretamente a um laminador de tiras a quente – e que a partir de então se espalharia pelo mundo.

Ela acabou de anunciar a construção de um moderno laminador de chapas grossas no meio-oeste americano, com capacidade para produzir 1,2 milhões de toneladas por ano, e que deverá estar pronto em 2022. De acordo com a empresa, ela deverá suprir até 97% dos tipos de chapas grossas demandados nos E.U.A. A Steel Dynamics, por sua vez, anunciou a construção de uma nova planta para produção de laminados planos a quente e a frio no sudoeste americano, especialmente voltada para a fabricação dos modernos aços AHSS para a indústria automotiva, que deverá entrar em funcionamento em 2021. Aqui a novidade será o uso de forno elétrico para refino do aço líquido – uma alternativa mais ecológica, pois a geração de gás carbônico é bem menor do que a que ocorre na siderurgia integrada.

Contudo, a empresa reconhece que deverá aperfeiçoar o processo de refino no forno elétrico para que os aços elaborados tenham o mesmo grau de pureza conseguido pelas aciarias a oxigênio. Por sua vez, a ArcelorMittal e U.S. Steel anunciaram um pacote de investimentos da ordem de seis bilhões de dólares para a modernização de plantas já existentes, de forma a garantir a fabricação de produtos com alta qualidade e baixo custo.

 


Nome do autor: Antonio Augusto Gorni

Engenheiro de Materiais pela Universidade Federal de São Carlos (1981); Mestre em Engenharia Metalúrgica pela Escola Politécnica da USP (1990); Doutor em Engenharia Mecânica pela Universidade Estadual de Campinas (2001); Especialista em Laminação a Quente. Autor de mais de 200 trabalhos técnicos nas áreas de laminação a quente, desenvolvimento de produtos planos de aço, simulação matemática, tratamento térmico e aciaria.

 

Conheça nosso site de eventos: http://www.grupoaprenda.com.br/

Leia mais aqui:

http://sfeditora.webcontent-dev.com.br/gases-combustiveis-siderurgicos/