Utilizando o diagrama de Ellingham na solução de problemas de atmosferas em Tratamento Térmico

O diagrama de Ellingham nem sempre é pensado como uma ferramenta para os profissionais de tratamento térmico. Este artigo demonstra a sua utilidade

Hrold Thomas Johann Ellingham (1897-1975) foi um físico-químico britânico e é mais conhecido por diagramas nomeados em homenagem a ele, que mostram a mudança na energia livre padrão em relação à temperatura para reações como a formação de óxidos, sulfetos e cloretos de vários elementos, tais como:

2x/y?M + O2 <–> 2/yMxOy

O gráfico do óxido tende a ser o mais comum e vai ser destacado aqui por sua aplicabilidade a processos de tratamento térmico, o mais relevante. Este fenômeno era conhecido antes da época de Ellingham, mas ele o demonstrou de forma mais clara e o tornou mais acessível para a indústria como uma ferramenta. Seu diagrama e suas variantes ajudam a escolher o melhor agente redutor para minérios diversos no processo de extração de metais..

Ellingham descobriu que normalizando as funções termodinâmicas para uma determinada reação com um mol de oxigênio ele foi capaz de comparar a estabilidade da temperatura de vários óxidos diferentes no mesmo diagrama. Em especial, e essa reação é crítica para os sistemas de redução de metal que usam dióxido de carbono, ele poderia mostrar graficamente que o carbono se torna um forte agente redutor quando a temperatura aumenta. A redução de óxidos de metais com carbono (ou monóxido de carbono) para formar metais livres reduzidos é de imensa importância industrial (altos fornos de redução de minérios de ferro), e os diagramas Ellingham mostram a menor temperatura na qual a reação vai ocorrer para cada metal.

Vamos voltar e ir passo a passo através do diagrama de Ellingham para expor e tornar mais claro como tratadores térmicos de metal podem usá-lo. Podemos adaptar o diagrama do seu uso original como uma ferramenta de metalurgia extrativa de alta temperatura, para um onde podemos prever os efeitos de atmosferas protetoras e impurezas atmosféricas comuns e seu impacto no produto tratado termicamente. Veja na figura 1 o diagrama de Ellingham clássico, que normalmente seria utilizado para os processos de atmosfera de tratamento térmico.

Base Teórica

Um diagrama de Ellingham é um gráfico do DG (mudança na energia livre de Gibbs) versus a temperatura, o que, para os nossos propósitos, seria a temperatura em um forno contínuo, por zona ou em um forno câmara por tempo em ciclo. O diagrama de Ellingham mostrado é para metais reagindo para formar óxidos.

Uma vez que qualquer explicação de como calcular e plotar um diagrama de Ellingham refere-se mais à mecânica do processo de derivação e menos a como usar a ferramenta, que é a intenção deste artigo, o conceito será coberto muito brevemente aqui.

A entalpia (DH) e a entropia (DS) são essencialmente constantes com a temperatura. Salvo que uma mudança de fase ocorra, o gráfico da energia livre (DG) versus a temperatura pode ser desenhado como uma série de linhas retas, onde DS é a inclinação e DH é a intersecção com o eixo y.

DeltaG = DeltaH – T DeltaS

Os coeficientes angulares das linhas traçadas mudam quando qualquer um dos materiais envolvidos fundem (M) ou vaporizam (B). Em um sistema de tratamento térmico, isto é (na sua maior parte) irrelevante, exceto nos processos de soldagem e sinterização onde as mudanças de fase (fusões) podem de fato ocorrer.

A energia livre de formação é negativa para a maioria dos óxidos metálicos, o que significa que a reação pode continuar sem influência. Portanto, o diagrama é desenhado com DG = 0 na parte superior do diagrama, sendo que os valores de DG indicados são todos números negativos. As temperaturas onde o óxido de metal se funde (M) ou vaporiza (B) estão marcados no diagrama.

Note que a maioria das curvas para metais tem inclinação para cima porque tanto o metal quanto o óxido existem como fases condensadas, sólidas ou líquidas. A pressão parcial do oxigênio é tomada como 1 atmosfera e todas as reações são normalizadas e em seguida plotadas para representarem o consumo de um mol de O<sub>2</sub>.

Curiosamente, existem duas curvas que não se parecem com todas as outras.

C + O2 => CO2

O carbono, um sólido, reage com um mol de oxigênio e produz um mol de dióxido de carbono (CO<sub>2</sub>), o que resulta em pequena mudança de entropia – uma curva quase horizontal. A outra tem uma inclinação negativa distinta:

2C + O2 => 2CO

Nesta reação, um sólido mais uma vez reage com um mol de gás, mas produz dois moles de gás – o monóxido de carbono (CO). Isso provoca um aumento substancial da entropia, e a curva tem uma inclinação negativa diferente.

O severo declive negativo dessa reação de carbono resulta em um agente redutor cada vez mais potente enquanto a temperatura aumenta. Por exemplo, a 1500°C, a reação de carbono cruza abaixo da de dióxido de silício (SiO2), resultando na capacidade potencial de reduzir o composto altamente estável de SiO2 para o silício em condições deficientes de oxigênio.

Observe que no diagrama há uma escala à direita e ao longo da parte inferior do gráfico ilustrando a PO2 (atm). A PO2 é plotada com valores de pressão parcial de 1 a 10-100. Será mostrado como utilizar esta escala na próxima seção, juntamente com as escalas imediatamente à sua direita, demonstrando a relação de PH2/H2O e PCO/CO2 a vários metais e seus óxidos, em função da temperatura. Estes valores de pressão parcial e suas razões associadas podem ser plotados no diagrama de Ellingham e podem ser obtidos por amostragem da atmosfera do processo a diferentes temperaturas, ou em momentos específicos (temperaturas) em um ciclo, usando ferramentas analíticas de atmosfera disponíveis rápidas e familiares (oxigênio, hidrogênio, ponto de orvalho / umidade, CO e CO<sub>2</sub>).

Diagrama de Ellingham para Processamento de Metais

Ao plotar se um dado sistema metálico irá oxidar, reduzir ou permanecer como um óxido ou metal puro, o diagrama de Ellingham não indica a taxa quantitativa da reação, apenas a probabilidade da sua ocorrência com base em um determinado conjunto de condições. Pode-se fazer a suposição de que a reação irá qualitativamente ocorrer mais rapidamente quando a temperatura aumenta ou quando as condições para a redução ou oxidação se desviarem mais das condições de atmosfera neutra.

Podemos usar o diagrama para determinar a relativa facilidade através do qual o metal pode ser oxidado ou um óxido pode ser reduzido. Metais plotados no alto do diagrama são mais fáceis de serem reduzidos (metais nobres) do que os traçados mais baixo no diagrama, que naturalmente tendem a existir na forma de óxido muito estável. Por exemplo, Ag, ou prata, é muito difícil de ser oxidada, enquanto Ca, ou cálcio, não existe naturalmente na forma de elemento, indicando uma forma de óxido muito estável. As curvas de óxido de metal / metal também se inter-relacionam entre si. Um metal plotado abaixo de outro metal pode reduzir o óxido de um metal mais acima no diagrama. Assim, o titânio, não o óxido, pode reduzir o óxido de cromo, que é plotado acima no diagrama.

Nós também podemos usar o diagrama para determinar o seguinte a uma dada temperatura:

– A proporção de hidrogênio para água / ponto de orvalho (PH2/H2O) que pode reduzir um óxido de metal para metal ou prevenir que um metal oxide;
– A proporção de CO para CO2 (PCO/CO2) que pode reduzir um óxido de metal para metal ou prevenir que um metal oxide;
– A pressão parcial de oxigênio que vai estar em equilíbrio com um óxido de metal.

Determinando a Pressão Parcial do Equilíbrio do Oxigênio

Para uma PO2 superior ao valor de equilíbrio a uma dada temperatura, o metal será oxidado. Por outro lado, para uma pressão parcial de oxigênio, que é inferior ao valor de equilíbrio a uma determinada temperatura, o metal será reduzido.

Use a escala ou nomograma para determinar a PO2 de equilíbrio através do seguinte método. Usando uma régua e conhecendo a temperatura ou a série de temperaturas que você deseja usar (e o sistema metal / óxido de metal), coloque um lado da régua no canto superior esquerdo do diagrama, que é rotulado de “O” (perto da curva Ag para óxido de prata). Em seguida, posicione a régua deste ponto de ancoragem até o ponto de temperatura onde o metal em questão cruza o valor de temperatura. Agora, continue a curva da régua até o valor na escala PO2. Essa é a pressão parcial de equilíbrio do oxigênio. Para este diagrama, é expresso em atmosferas. Mais uma vez, qualquer pressão parcial do oxigênio menor do que a procedente causará redução metálica. Qualquer pressão parcial acima irá causar oxidação.

Para um exemplo da vida real, encontre a pressão parcial de equilíbrio do oxigênio para o cromo, a uma temperatura de 1300°C. Coloque a régua sobre o ponto “O” no canto superior esquerdo do diagrama. Encontre a curva do cromo e onde ela cruza a temperatura de 1300°C. Enquanto fixa a extremidade da régua sobre o ponto “O”, mova a outra extremidade da régua de modo que ela passe através desse ponto de intersecção e continue a descer até a escala de PO2. Leia o valor, que deve ser expresso em 10-16 atmosferas. Esta é uma quantia extremamente pequena de oxigênio que pode estar presente neste sistema de alta temperatura, antes que os efeitos danosos do oxigênio possam oxidar negativamente o cromo metálico.

O efeito da oxidação do cromo, mesmo por pequenas quantidades de oxigênio, pode ser combatido através de um forte agente redutor da atmosfera, como o hidrogênio. Vamos seguir para a determinação da razão de equilíbrio (PH2/H2O) ou a razão hidrogênio-água (ponto de orvalho).

Determinando a Razão de Equilíbrio PH2/H2O

Para a razão PH2/H2O ou hidrogênio-água, que seja superior ao valor de equilíbrio – relativamente mais hidrogênio à água – a uma determinada temperatura, o metal será reduzido. Para uma PH2/H2O que seja inferior ao valor de equilíbrio (relativamente menos hidrogênio à água) a uma dada temperatura, o metal será oxidado.

Utilizando essencialmente o mesmo método da régua que usamos acima para traçar a pressão parcial de equilíbrio do oxigênio, traçamos, agora, do ponto “H”, sobre o lado esquerdo do diagrama, através do nosso metal e da temperatura desejados e, agora, lemos da curva PH2/H2O do lado direito do diagrama.

Um exemplo real seria encontrar a razão equilíbrio hidrogênio-água para o cromo, a uma temperatura de 1300°C. Posicione a régua do lado esquerdo no ponto “H”, passe através da equação do cromo, onde cruza em 1300°C e anote a razão de equilíbrio de hidrogênio-água na escala PH2/H2O. O valor deve estar entre 102 e 103. Isso representa um valor entre 100 e 1.000 para 1 razão de hidrogênio necessária para água ou nível de ponto de orvalho. Para este exercício, podemos estimar a razão de hidrogênio para a água como de 400 para 1.

Este é um nível elevado de hidrogênio que é necessário para combater os efeitos oxidantes da água ou do ponto de orvalho em cromo, daí o motivo porque o processamento da maioria dos aços inoxidáveis (cromo presente como uma liga) a alta temperatura geralmente é feito em níveis muito elevados de hidrogênio – muitas vezes 100%. Na temperatura de processamento de 705°C, na presença de hidrogênio, variedades de oxigênio irão converter em água e se tornar uma parte de qualquer umidade ou ponto de orvalho que podem estar no sistema da atmosfera de processamento. Hidrogênio suficiente deve estar presente no sistema de atmosfera para conter a oxidação do cromo. Com uma razão muito baixa de hidrogênio para um determinado nível de umidade, a oxidação do cromo ocorrerá. Sem hidrogênio nesse sistema de atmosfera (processo de forno a vácuo excluído), é literalmente impossível excluir oxigênio suficiente do sistema a fim de evitar a oxidação do cromo.

Determinando o Índice de Equilíbrio PCO/CO2

A PH2/H2O, ou razão CO/CO2, é usada com mais frequência em sistemas de metalurgia extrativa para todos os metais a fim de determinar se essa reação vai reduzir ou oxidar um sistema metálico a uma determinada temperatura. Nos metais tratados termicamente, a razão é geralmente utilizada para ligas de aço-carbono para determinar se o metal irá descementar ou cementar. É a espinha dorsal da cementação e têmpera e todos os seus processos derivados.

O tema da cementação e seus processos derivados são reservados para artigos muito além do espaço alocado e do escopo deste artigo sobre o diagrama de Ellingham. Há muito mais a ser considerado que apenas plotar o valor da razão de equilíbrio CO/CO2. Nestes sistemas, muitas vezes estamos interessados na profundidade do carbono no ferro, as atividades, as taxas de difusão, o tempo na temperatura, o grau de oxidação da superfície e sua remoção, os perfis de concentração de carbono, evitar a oxidação intergranular (IGO – Intergranular Oxidation), etc., para citar apenas algumas variáveis. No entanto, podemos ter uma idéia aproximada de qual deve ser a relação de equilíbrio para definir as condições para promover a descementação deliberada, no caso dos aços elétricos. No caso da cementação do aço, podemos pelo menos ver qual razão de equilíbrio devemos ultrapassar para fazer com que o processo de cementação ocorra.

Resumo

O trabalho de Harold Ellingham tornou mais claros e acessíveis, em um formato gráfico de fácil entendimento, os conceitos bem conhecidos da energia livre padrão em relação à temperatura para reações como a formação de óxidos, sulfetos e cloretos. No caso do seu diagrama de metal e metal-óxido, normalizando as funções termodinâmicas para a reação com um mol de oxigênio, Ellingham foi capaz de comparar a estabilidade da temperatura de vários óxidos diferentes no mesmo diagrama. O resultado foi o seu diagrama de Ellingham, relativamente fácil de usar para determinar as condições de oxidação e redução, sem ter de recorrer a esforços meticulosos para inter-relacionar os cálculos baseados em energia livre de todos os sistemas metálicos a partir do zero. A adição do nomograma original como ferramenta que plota, em uma escala contínua, os valores de PO2 para facilidade de cálculo pelo usuário é o trabalho de F.D. Richardson e Jeffes.

Já que as razões CO/CO2 e H2/H2O são frequentemente usadas em conjunto com a determinação da pressão parcial de equilíbrio do oxigênio, L.S. Darken e R.W. Gurry acrescentaram seus cálculos como escalas de nomograma para estas razões adicionais. Estes diagramas foram posteriormente referidos como Ellingham, Ellingham-Richardson, Darken e Gurry, ou diagramas modificados de Ellingham.

Para mais informações: Contate Michael J. Stempo, P.E., desenvolvimento de negócios / aplicações de engenharia, Air Liquid Industrial U.S LP, 2700 Post Oak Boulevard, Suite 1800, Houston, TX 77056, EUA, tel: +1 610-997-0936, e-mail: mike.stempo@airliquide.com; web: www.us.airliquide.com

 

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